Laboratório de Paleontologia da UEPG guarda tesouros de 400 milhões de anos

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Um lugar cuja missão é recontar a história do planeta. Quatrocentos milhões de anos de história estão armazenados no Laboratório de Paleontologia da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). Localizado no Campus Uvaranas, o laboratório possui coleção de mais de 20 mil amostras de registros animais e vegetais, datados, em sua maioria, do Período Devoniano.

O Laboratório é sede do grupo de pesquisa Palaios – Paleontologia Estratigráfica, do Programa de Pós-graduação em Geografia da UEPG (PPGGeo), e é coordenado pelo professor Élvio Pinto Bosetti. O objetivo é reunir, numerar, catalogar e armazenar as amostras coletadas em campo pelos pesquisadores do Grupo e disponibilizá-las para o desenvolvimento de pesquisas. O Palaios opera em rede e reúne sete universidades de diferentes regiões do Brasil, sob coordenação da UEPG, na realização de estudos em conjunto na área.

A história do Laboratório de Paleontologia se integra à trajetória profissional de seu coordenador e fundador. Élvio explica que o Laboratório foi criado no ano de 2000, quando deu início ao seu trabalho de Doutorado e, junto de cinco alunos, começou a organizar e catalogar o acervo paleontológico da Universidade. Após negociações com a Reitoria da UEPG, foi criado o espaço, cuja estrutura é a mesma desde 2012. Desde sua fundação, o Laboratório de Paleontologia e as pesquisas ali desenvolvidas tornaram a UEPG referência na área e os resultados dessa atuação são as parcerias com diversas instituições.

“Somos referência nacional em pesquisas do Devoniano. Eu não conheço, na América do Sul, acervo desse período maior que o nosso”, exalta o professor. Ele ressalta a referência que o Laboratório de Paleontologia da UEPG e seu extenso acervo representam para a Ciência, com um nível de abrangência de seus trabalhos que englobam desde pesquisas internacionais, publicações em revistas no Brasil e eventos locais. A atuação do Laboratório é, há anos, reconhecida pela Sociedade Brasileira de Paleontologia. “Nosso trabalho tornou Ponta Grossa um polo formador de paleontólogos reconhecido em todo o país”.

Outro diferencial para a atuação do Laboratório está nas características da região dos Campos Gerais, marcada pela grande presença de fósseis do Período Devoniano. A região concentra grande diversidade de registros, carregados de informações sobre a vida no planeta há 400 milhões de anos. Durante o Devoniano, datado de 416 milhões a 359 milhões de anos, a região estava submersa por grande oceano, onde uma incrível variedade de formas de vida florescia.

Em meio à diversidade de conchas, vermes e trilóbitas, ancestrais dos artrópodes, o Laboratório detém tesouros únicos: esqueletos e barbatanas de pequenos peixes e tubarões que nadaram pelos Campos Gerais passam quase imperceptíveis nas rochas, não fosse o olhar treinado dos paleontólogos. As amostras são únicas no mundo e compõem pesquisa em andamento no Laboratório, encabeçada pela doutoranda Iniwara Kurovski.

A rotina do paleontólogo

Saber identificar o registro fóssil é apenas uma das etapas da missão dos pesquisadores. Os trabalhos iniciam fora do Laboratório, nas áreas fossilíferas, localizados nas cidades de Ponta Grossa, Tibagi, Arapoti, Jaguariaiva e outros municípios da região que um dia formou um mar primordial. Após a identificação dos exemplares nos afloramentos, é feita a extração da fração de rocha onde estão inseridos os espécimes. Uma vez coletados, os materiais são embalados, com a devida identificação de onde foram retirados, e levados ao Laboratório, onde passam pela curadoria, que consiste na limpeza e numeração.

Após a catalogação, os fósseis são registrados no Livro Tomo do projeto, onde estão inscritas amostras coletadas pela equipe e por pesquisadores de outras instituições que tem a UEPG como referência. Estão registrados nos livros mais de vinte mil peças; o número de espécimes, contudo, supera os cem mil indivíduos, considerando os animais e plantas fossilizados nos mesmos afloramentos.

O trabalho do Laboratório de Paleontologia da UEPG é desenvolvido por nove estudantes bolsistas de Iniciação Científica, Mestrado e Doutorado que compõe o Projeto Palaios na UEPG. Eles comentam sobre o seu amor pela Paleontologia e revelam os caminhos e as escolhas que os levaram aos estudos na área. “Essa área me fascina desde criança. Antes de entrar na Universidade já pesquisava sobre o tema, na Iniciação Científica Jr., o que possibilitou eu me aproximar mais do tema e das pessoas que o pesquisam quando passei no Vestibular em Geografia”, declara Luana Oliveira, mestranda do PPGGeo e uma das paleontólogas do Laboratório. “Sempre fui a estranha da família”, brinca Luana, ao relembrar seu interesse pela vida pré-histórica.

Por sua vez, Gabrieli Goltz descreve que sua entrada para o campo foi “por acaso”. A bióloga e doutoranda revela que a paixão pela Paleontologia teve início durante uma atividade prática em campo, durante a graduação. “Durante a escavação eu encontrei alguns fósseis. E o professor Elvio, que estava presente na atividade, percebeu a minha felicidade e ofereceu a oportunidade de ser pesquisadora pelo projeto. Eu, que era interessada por outra área, me apaixonei pela Paleontologia”. Para o doutorando Kevin William Richter, também biólogo, o caminho foi mais longo: “Na graduação eu passei por várias áreas, em diferentes grupos de pesquisa, até entrar para o Grupo, quando fiz Mestrado. O começo foi difícil, mas como era uma área que me fascinava desde pequeno, foi importante para mim”.

Acesso ao público 

A riqueza paleontológica dos Campos Gerais pode ser vista pela população. Parte do acervo coletado pelo Grupo Palaios e o Laboratório de Paleontologia está em exposição do Museu de Ciências Naturais da UEPG (MCN), no Campus Uvaranas. A coleção de fósseis do MCN conta com cerca de duzentas peças, com destaque ao material do Período Devoniano. O coordenador do Museu, professor Antônio Liccardo, destaca ser essencial expor as peças para exaltar a referência que a UEPG é nesse campo de estudo.

“O Museu de Ciências Naturais é uma vitrine para essas pesquisas. Levamos ao público um conhecimento desenvolvido ao longo de décadas e que tornaram nossa universidade referência nesse campo do conhecimento”, destaca o coordenador. Ele ressalta que cada fóssil exposto é único e carregado de informações. “Nossa função, enquanto Museu, é traduzir essas informações ao público e despertar o fascínio das pessoas sobre o passado da Terra”. O Museu de Ciências Naturais da UEPG funciona de segunda à sexta-feira, das 9h30 a 12h e das 14h00 às 17h30.

Reconstruindo tesouros 

No dia 2 de setembro de 2018, o Museu Nacional, no Rio de Janeiro, foi parcialmente destruído por incêndio, que queimou grande parte do seu acervo. Entre os materiais consumidos pelo fogo, haviam amostras fósseis doadas pela UEPG. Desde que iniciaram os esforços para reconstrução do Museu, a Universidade é parceira na reestruturação da sua coleção. No dia 14 de junho, o Laboratório de Paleontologia da UEPG recebeu a visita de equipe do Museu Nacional.

Os paleontólogos Sandro Schefler, do Museu Nacional, e Rafael Silva, do Serviço Geológico Brasileiro (SGB), foram recebidos pelo coordenador do Laboratório de Paleontologia, professor Élvio Bosetti, os pesquisadores do laboratório e o coordenador do Museu de Ciências Naturais da UEPG, professor Antônio Liccardo. O objetivo da visita foi conhecer o acervo do Laboratório e recordar a parceria de longa data das duas instituições.

O Museu Nacional é vinculado à Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), uma das instituições que compõem o Grupo Palaios. “Quando aconteceu o incêndio, eu perdi material”, lamenta o professor Elvio. Ele considera como muito boa a relação da UEPG com a UFRJ e o Museu Nacional dentro do esforço conjunto das universidades que compõem o grupo para auxiliar na reconstrução do acervo.

O vínculo do Museu Nacional com a região dos Campos Gerais data desde antes da criação da UEPG. Os primeiros registros de fósseis devonianos da região foram feitos pela Comissão Geológica do Império, no final do Século XIX, e levados ao Rio de Janeiro, onde, posteriormente, foram incorporados ao acervo do Museu Nacional. A visita dos pesquisadores, no último dia 14, também possibilitou a gravação de imagens para documentário em produção, sobre os caminhos percorridos por pesquisadores para a formação da coleção do Museu, antes de sua destruição.

“Temos atuado em conjunto há muitos anos. A importância da UEPG é fundamental, principalmente quando vamos à campo nos Campos Gerais para reconstruir nossas coleções”, explica Schefler. Ele destaca que a Universidade, por meio do professor Elvio, desenvolve pesquisas de ponta na área da Paleontologia, que a tornam referência nacional. Rafael Silva, do SGB, destaca que, após mais de um século desde as primeiras expedições paleontológicas na região, é essencial revisitar a coleção da UEPG para conhecer as novas descobertas até então escondidas pela Terra.

Texto: Gabriel Miguel | Fotos: Gabriel Miguel e Arquivo Pessoal


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