Sonhos não envelhecem. E o de Autanir Carneiro perdurou por 40 anos, até que se concretizasse em 2021. Apaixonado por música desde jovem, o funcionário público volta à Universidade para estudar o curso de Licenciatura em Música. Mas dessa vez ele não vem sozinho. O filho, Raony Carneiro, é agora seu colega de turma. Ambos prestaram o mesmo Vestibular, pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG).
A UEPG não é nova amiga para eles, ambos são egressos da Universidade. A volta à graduação, no entanto, ocorre em tempos de aulas remotas, em um curso essencialmente prático. A adaptação à nova fase dos dois não apaga que, como diz Friedrich Nietzsche, “sem a música, a vida seria um erro”.
O Pai
A música sempre ficou lá dentro de Autanir. Em 2019, decidiu acordar o desejo por aprender novamente e se inscreveu para o Vestibular da UEPG, mas a aprovação não veio naquele ano. “Em 2020 eu não iria fazer a prova novamente, mas o Raony falou ‘pai, eu vou fazer Vestibular de Música, vamos fazer juntos?’”.
O Filho
A entrada de Raony no relato foi a chave para a volta de Autanir à Universidade. Porém, a história do filho com a música não começa em 2021. Formado em Geografia pela UEPG, Raony, agora com 26 anos, já estudou no Conservatório Municipal Maestro Paulino e até participou de projetos de música. Mesmo não aprendendo o que sabe de música com o pai, Raony é enfático – a primeira influência para gostar da arte começou dentro de casa, por meio de Autanir. “Eu cresci vendo meu pai tocando em casa, sempre tínhamos festa com música, sempre teve vários discos lá em casa, várias coleções. Assim é difícil não acabar se envolvendo com música”, destaca.
Quando criança, Raony aprendeu musicalização e teve aulas de piano. “Nós não tínhamos piano em casa. Não tinha como comprar. Aí fui pro violão, o instrumento que a gente já tinha”, relembra. Com as dificuldades de conciliar as aulas do Conservatório com a rotina, Raony optou pela Geografia na saída do ensino médio. “Até queria fazer música, mas não queria fazer aqui por ser licenciatura. Queria fazer uma universidade de violão ou algo do tipo, só que com o tempo acabei tirando a ideia da cabeça”. O acadêmico se formou, casou, fez mestrado em geografia e deu aula para o Estado antes de voltar à Universidade. “Um pouco antes do pai fazer a primeira tentativa no Vestibular, teve um camarada meu que passou em Música e começamos a tocar juntos em um grupo”. A partir daí, Raony começou a conhecer mais o curso e se interessou. “Vi que meu pai fez o Vestibular para Música e pensei em fazer também”.
A prova
O estímulo para Raony se inscrever no Vestibular veio do pai. “Pensei: ‘nossa! O pai fez, vou fazer também’. “Foi aí que incentivei ele a fazer de novo, eu falava ‘vamos fazer, se a gente passar a gente faz junto'”, conta Raony. O filho ficou ansioso para realizar a prova. Pela pandemia, o Vestibular foi adiado duas vezes e aconteceu em maio deste ano, com um rígido protocolo de biossegurança. “Trabalhei em um concurso posteriormente e pude comparar com o que fizemos na UEPG. Aqui foi muito mais seguro”, salienta o filho.
“Eu fui fazer a inscrição no último dia. Hesitei, porque ano passado já tinha reprovado, mas agora estamos aí na luta”, conta Autanir. Mesmo a escolha acontecendo na última hora, a aprovação veio em sexto lugar para o pai e em primeiro lugar para o filho.
O curso
O que o futuro reserva para os dois? “Você começa a fazer o curso e vê que o direcionamento é para lecionar mesmo. Na minha idade, aos 65 anos, muita gente pode olhar para mim e pensar: esse velhinho vai querer dar aula? Vou até onde dá, a motivação existe”.
A pandemia dificultou uma maior interação dos dois durante o curso. “A gente estudou algumas vezes juntos e conseguimos sentar para conversar. Mas se estivesse no presencial, acho que seria mais fácil essa interação”, explica Raony. A entrada na graduação em Música reafirmou a visão sobre as multipossibilidades que a arte pode trazer. “A música não é só violão, é muito mais do que isso. As reflexões que estamos fazendo no curso são muito do que eu penso. Não imaginava que já tinha gente estudando isso há muito tempo. Estou gostando muito do curso”, afirma.
A música
“Para mim é uma coisa muito forte. Não consigo viver sem música, sem tirar uma melodia, tentar entender uma letra. Não faz sentido a vida sem a música”, explica Raony. Enquanto a entrevista acontecia, a grama da Universidade estava sendo cortada do lado de fora de uma das salas de Música da Central de Salas. “Eu fico ouvindo esses caras cortando grama e já fico pensando na possibilidade de criar música, então para mim a música está em todo lugar, é essa vibração da vida”.
Texto e fotos: Jéssica Natal